
Poderia ter sido sob alguma montanha na Índia ou algum mosteiro no Tibete, mas foi ali mesmo, meditando debaixo da sombra de uma árvore ao lado do campinho de futebol, que encontrei a iluminação. Era uma manhã ensolarada no bairro em que cresci, no interior de São Paulo, haviam motoboys rasgando a avenida, jovens tomando açaí na praça e minha cachorra fazendo guarda ao meu lado quando encontrei a perfeição dentro de mim.
Não durou muito, talvez apenas alguns segundos, mas naquele momento sem sombra de dúvidas não desejei mais nada, tinha tudo e senti uma paz absoluta. Por isso me sinto preparado para te escrever essa carta agora.
Sei que está buscando wellness, equilíbrio, bem-estar, saúde integral, riqueza interior ou qualquer outro termo que queira usar para traduzir essa possibilidade de existência plena. Se não estivesse, não estaria lendo esse texto. Imagino também que já procurou em muitos lugares e por isso, talvez até mais do que curiosidade, tem a ambição de alcançar essa sensação para você também. Vivemos tempos difíceis com muitas transformações sociais, instabilidade econômica, pandemia mundial - é o famoso ”quem está bem, está mal informado''. Por isso é mais do que compreensível que wellness seja o maior tesouro de nossa sociedade, um mercado que já movimenta mais de 4 trilhões de dólares ao redor do mundo, segundo o Global Wellness Institute.
Exercícios, boa alimentação, hobbies, um trabalho que faça sentido, relacionamentos saudáveis e talvez uma boa quantidade de dinheiro no banco - uma fórmula perfeita para o wellness, que afinal engloba todas as áreas da vida e nos permite nos sentir seguros e pertencer a uma comunidade feliz. Porém existe um perigo nisso. Alan Watts, filósofo e um de meus mentores, usava uma analogia que gosto muito: Quando vamos ao banco passamos pela porta giratória, é necessário e até divertido, mas com certeza, não é nosso destino.
Esse é o perigo de nossa jornada pelo wellness: ficarmos presos rodopiando na porta giratória de nossa própria saúde e felicidade. Precisamos entender que essa é apenas a porta de entrada para o que realmente importa. É o primeiro passo na jornada real. Mas o que significa passar por essa porta? O que há além de nossa felicidade e saúde?
A tradição oriental tem um termo interessante para isso: Bodisatva. Se um buda é aquele que encontrou a libertação e a iluminação na montanha, um bodisatva é aquele que uma vez iluminado, desce para a cidade e usa o resto da sua vida para iluminar outras pessoas. Segundo os evangelhos foi Jesus quem disse que “Vocês são a luz do mundo?”.
Naquela manhã ensolarada no interior, ao lado do campinho e vigiado pela minha cachorra, percebi que mesmo sem a necessidade de nada, rico e pleno, ainda me haviam muitos planos e vontades. Afinal, uma pessoa em estado de wellness não é uma pessoa acomodada, e sim inspirada a viver uma vida real - que não é aquela que busca satisfação ou mesmo sentido, mas aquela que uma vez tendo tudo, abre mão para poder viver a voz em seu interior que diz “ame”. Lembre-se, Wellness é apenas a porta para sair do individualismo e entrar na plenitude do Oneness.
Wellness sem oneness é mais do que um perigo, é um sofrimento. Porque todos os esforços e recursos podem ser gastos para te fazer uma pessoa melhor e mais feliz, e mesmo assim, a fonte de seu sofrimento sempre será você. Ironicamente, a única forma de realmente encontrar a plenitude é se colocando em segundo plano, e uma vez entendendo que somos todos parte de um sistema, recebemos do todo os recursos para cuidar de nós. É paradoxal, eu sei, mas acredito em você e em sua jornada.
Termino te convidando a não mais dizer “quero wellness”, e começar a dizer: “Are you well?”. Esse é um ótimo começo...
*Texto originalmente publicado na revista Well.